Com bom humor e sarcasmo, Liv conta como o órgão genital feminino foi visto, compreendido e usado ao longo da história para regular a mulher na sociedade.
Confira a resenha do livro: A Origem do Mundo, Uma história cultural da vagina ou a vulva vs. o patriarcado, de Liv Stromquist, com tradução de Kristin Lie Garrubo, lançado em 2018 pelo selo Quadrinhos na Cia.
A Origem do Mundo, Uma história cultural da vagina ou a vulva vs. o patriarcado, é um quadrinho que traz, numa narrativa leve, muitos dados e informações sobre como o órgão genital feminino foi visto e entendido ao longo dos séculos. E como isso também moldou a condição da mulher em sociedade.
Liv, cientista política e socióloga, diz em entrevista para a Companhia das Letras, no festival #NaJanelaQuadrinhos, de 2020, que escolheu o tema do livro a partir de uma lembrança da sua adolescência. Na qual desmaiou pela dor de cólicas menstruais, por não ter coragem de abordar a professora e pedir licença para buscar remédio na enfermaria.
Ao conectar esse fato causado pelo constrangimento do seu corpo e de estar menstruada, com a vergonha e invisibilidade geral do corpo feminino e seu funcionamento, se questionou: quando esses tabus surgiram? E decidiu pesquisar sobre o tema.
Ao longo da pesquisa foi descobrindo cada fato bizarro, que precisou rir. Optando, então, pela ironia, deboche e humor para contar essa história que parece ficcional, mas não é.
"Certa vez li num livro que a diferença entre culpa e vergonha é que sentimos culpa pelo que fazemos, mas sentimos vergonha pelo que somos".
A história cultural da vagina ou a vulva, em quatro atos
O quadrinho é dividido em quatro partes: genitália feminina, orgasmo, menstruação e TPM. Em cada um, Liv, conta por quem e como cada tema era compreendido e abordado ao longo dos séculos, evidenciando que houve mudanças significativas de narrativa, sempre para atender interesses moralistas de uma sociedade patriarcal.
Começando por como alguns homens ditos intelectuais estavam obcecados em explicar a forma e o uso do órgão genital feminino. Com informações baseadas exclusivamente em suas ideias e compreensão limitada, formaram equivocadamente o imaginário coletivo sobre o órgão, trazendo relevantes consequências.
"Assim como Colombo ficava insistindo em batizar um monte de países sul-americanos em homenagem a si mesmo e seus colegas, existe em muitos meios, uma ENERGIA EXAGERADA focada em colonizar — com diversos métodos — o corpo feminino até o último cantinho, escuro e úmido".
Como a mutilação da vagina para amenizar uma suposta loucura e descontrole das mulheres ou atribuindo características particulares do órgão de cada mulher com o fato de serem, ou não, bruxas. Em épocas mais recentes, o desentendimento é refletido pela sua representação — errada ou incompleta —em livros didáticos ou em desenhos artísticos.
Quem sabe a diferença de vagina e vulva? Ou então quais são as partes que compõem o órgão genital feminino? Pois é…
Da mesma forma, o entendimento sobre o prazer feminino sempre foi desvirtuado, passando de descontrolado e perigoso para inexistente — conforme o interesse social da época. Sobre isso, Liv afirma que: “A posição da mulher na sociedade está diretamente ligada ao prazer e ao que é permitido para a mulher na cama. Quando houver mais igualdade social entre homens e mulheres, melhores serão também as relações sexuais”.
"A Construção da mulher sem desejo fez com que a mulher passasse a ser percebida como moralmente superior ao homem, dando lhe uma espécie de pseudopoder".
Na história, no período em que o prazer feminino foi ignorado, afirmando-se que elas — diferente dos homens — conseguiam se controlar e não tinham as mesmas necessidades, gerando uma oportunidade de emancipação social.
Pois, no lugar de controladas, ganharam certo respeito e status úteis em lutas sociais, criando espaço e autonomia. Além do alívio por ter cessado a desconfiança e preconceito do período em que eram tidas como sedutoras, perversas e manipuladoras.
Mas claro, tudo isso trouxe sérias consequências ao longo dos anos, por ignorarem seu próprio desejo e prazer, mulheres entram num período obscuro de não compreensão do seu corpo e necessidades.
"No entanto, o requisito/preço desta elevação parcial na sociedade era a aniquilação total da própria sexualidade".
Deturpando também questões naturais como TPM e menstruação, que no passado chegaram a ser vistos como parte de um ciclo sagrado, nos últimos séculos passaram a ser pecaminosos, sujos e vergonhosos. Envolto em mitos e tabus, o assunto tornou-se proibido e mulheres passaram a gastar muita energia escondendo estarem em seu período menstrual.
Sem falar dos sintomas da tensão pré-menstrual, que tornaram-se argumentos para comprovar como as mulheres são malucas, estressadas ou exageradas, invalidando o comportamento feminino. Entretanto, de forma seletiva, esses argumentos não servem para liberar nenhuma mulher de suas responsabilidades cotidianas por estarem de TPM.
"Ninguém escreveu relatórios de pesquisa argumentando que mulheres com TPM brigam demais com seus filhos e, portanto, seria melhor que os homens ficassem em casa com os filhos e as mulheres saíssem para trabalhar".
É triste mas é verdade
A longa e detalhada pesquisa de Liv, nos apresenta uma sequência de fatos surreais, mas também esclarecedores. Principalmente porque as vozes que criavam essas narrativas eram sempre masculinas.
Ainda bem que com o feminismo e a emancipação da mulher em sociedade, o controle dessas narrativas foram retomados e temos mulheres como Liv para reconstruir nossa história. Com um texto é leve e acessível, transformando muitos dados e informações duras em uma conversa super bem humorada — afinal, só rindo pra não chorar.
Ainda estamos distantes de uma sociedade igualitária, informada e eovluída a ponto de abandonar tabus e preconceitos. Mas, leituras como essa dão esperança! Recomendo demais essa obra, para mulheres de todas as idades, e que sigamos no controle de nossas próprias narrativas.
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E aqui mais infos sobre essa obra incrível:
Recentemente foi lançada uma peça de teatro inspirada nesse livro, saiba mais aqui.
Confira na íntegra a entrevista da escritora citada na resenha, aqui.
Obrigada por ler! 🤓
Espero que tenha gostado e se inspirado a ler o livro.
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Nos vemos no próximo texto 🥰
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