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  • Foto do escritorAdriana Ferreira

Resenha do livro: O Parque das Irmãs Magníficas, de Camila Sosa Villada

Atualizado: 5 de jan.

Uma autobiografia, com toques de ficção e fantasia, que nos coloca dentro de um universo cheio de dor e alegria.

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Confira a resenha do livro O Parque das Irmãs Magníficas, de Camila Sosa Villada, com tradução de Joca Reiners Terron e publicado selo Tusquets da editora Planeta de Livros em 2019.


Ao contar sua história e a de um grupo de amigas travestis, na Argentina, Camila Sosa Villada, nos coloca em outra realidade. Partindo do resgate de um bebê abandonado, que servirá de fio condutor da ficção, entramos em um lugar cheio de olhares preconceituosos, julgamentos, negação de direitos básicos e uma luta diária, surpreendentemente alegre, por sobrevivência.


O livro é uma autobiografia, com toques de ficção e fantasia, narrada por Camila, a personagem principal, de mesmo nome da autora. Que compartilha de forma sensível e bastante realista sua vida, desde a infância, como se descobriu travesti até a fase adulta, quando precisou sair de casa para ter a liberdade de ser quem era. Dando detalhes desse processo cheio de dúvidas, medos e alívios.

"Essa foi a origem deste livro, essa é a alquimia que ocorre em suas páginas: a transformação da vergonha, do medo, da intolerância, do desprezo e da incompreensão em alta prosa".

São fortes os trechos em que conta como sua família lidou com a situação, como se sentiu e o que teve que fazer para conseguir a liberdade de ser quem é. Muito duro ver o preconceito nascendo em casa, por quem mais esperamos amor e aceitação. Da mesma forma, como é necessário compreender que atitudes assim nem sempre são fundamentadas no ódio, mas sim na ignorância e frustração de pais que custam a aceitar a realidade que se apresenta.

"Não teve polícia, nem clientes, nem crueldades que me atemorizaram mais que meu pai. Em honra à verdade, acredito que ele também sentia um medo pavoroso de mim. É possível que aí seja gestado o pranto das travestis: no terror mútuo entre o pai e sua cria travesti".

As relações familiares são sempre complexas e a da Camila não é diferente. Ao longo do livro vamos conhecendo seus pais nas suas diferentes camadas e por novas perspectivas. Nenhuma atitude acaba sendo justificada, mas muitas passam a fazer algum sentido.

Por falta de acolhimento, respeito e oportunidade, a protagonista acaba tendo o destino de muitas outras travestis: a rua. Nesse novo universo ela encontra um grupo de amigas, que também vivem à margem social, e juntas, formam sua própria comunidade. Construída na base da união, cumplicidade e empatia, a comunidade das Irmãs Magníficas é alegre e livre.

Um lugar onde podem ser quem são, agir como querem e fazer o que é preciso para sobreviver. Juntas elas compartilham suas frustrações, conquistas, histórias tristes e felizes de tudo que passam na vida particular e profissional. Em meio a esse intenso convívio, por vezes, também ocorrem brigas, mágoas e disputas.

É no parque que todas se encontram para trabalhar e é onde os relatos mais dolorosos acontecem. A prostituição acaba sendo o ganha-pão delas, mas também fonte de humilhação, violência, doenças, drogas e ácool. Para se manterem vivas e seguras, elas criam suas próprias regras, se apoiam e se aconselham, conforme podem.

O grupo é diverso, com mulheres de diferentes gêneros, idades e origens. Mas, há entre elas a matriarca: Tia Encarna. Ela é a mais experiente e a única com uma casa, a qual transformou num grande abrigo para as amigas do parque. Desempenhando um papel de conselheira, mãe e por vezes, única provedora, ela também passará por uma profunda transformação, ao encontrar a maternidade.

"Vão para a casa da Tia Encarna, a pensão mais maricas do mundo, que acolheu tantas travestis, escondeu, protegeu, asilou em momentos de desespero. Vão para lá porque sabem que não poderiam estar mais a salvo em nenhum outro lugar".

Elas não precisam fazer nada para chamar a atenção, não precisam fazer nada para despertar as críticas e ofensas nas ruas. Não precisam fazer nada para serem alvo de desejo e, ao mesmo tempo, violência. Foi impossível, durante a leitura, não me colocar no lugar dessas mulheres e sentir os olhares de reprovação e preconceito que elas recebiam apenas por existirem.

"Apenas baixando a cabeça, as travestis obtêm o dom da transparência que lhes foi dado no momento do seu batismo".

Ao mesmo tempo, elas possuem uma vontade enorme de viver e encontrar a felicidade. Mesmo diante da realidade mais dramática, a esperança sobrevive e os sonhos alimentam a alma, na espera de dias melhores. O colorido das roupas e da maquiagem, a risada e salto alto lhes dão superpoderes para enfrentar as batalhas, que lá, no fundo, elas sabem que já estão perdidas.

Dói ler alguns trechos do livro, não que o preconceito e a violência com comunidade LGBTQIA + seja novidade, porque infelizmente não são. Mas, através dessa narrativa tão envolvente e honesta, me senti em meio a comunidade, como se vivêssemos no universo de Camila e suas amigas, por um tempo. Dá vontade de defendê-las, protegê-las do mau e ignorância alheia. Ninguém merece viver à margem apenas por ser quem é.

E ninguém tem o direito de marginalizar determinados grupos, apenas por não concordar com quem são ou como levam sua vida. Na obra, vemos a história de Camila e suas amigas se desenrolar para finais distintos, porém igualmente dramáticos. Deixando a certeza de que em uma sociedade preconceituosa e com facilidade para ignorar existências fora do padrão, um final feliz é raro, mas não impossível.


Que essa leitura chegue a muitas e muitas pessoas, despertando mais empatia e respeito. Pois, se cada leitor, que for tocado pela história, fizer a sua parte, já daremos um primeiro passo importante. Recomendo demais essa obra!

Sobre a escritora:

Camila Sosa Villada é argentina, com formação em Comunicação Social e Teatro, trabalhou por muitos anos como atriz no teatro, cinema e televisão, para então, iniciar a carreira de escritora, que já conta com cinco obras publicadas. Em 2022 ela vem ao Brasil para participar da Flip - Festa Literária de Paraty (RJ).

 

Se você gostou da resenha do livro, confira abaixo o link para adquirir a obra e outros conteúdos que vão enriquecer ainda mais a sua experiência de leitura:


Em 2020, o livro "Las Malas", título original de O Parque das Irmãs Magníficas, recebeu o Prêmio Sor Juana Inés de la Cruz. A premiação reconhece, desde 1993, o trabalho literário de mulheres em idioma espanhol da América Latina e do Caribe. Cada ano se premia um livro de romance publicado no ano anterior em espanhol. Seu nome é uma homenagem à escritora Sor Juana Inés de la Cruz.

 
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Obrigada por ler! 🤓


Espero que tenha gostado e se inspirado a ler o livro.


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Nos vemos no próximo texto 🥰



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